Você está na cidade de:

Ruth Escobar: Conheça a história dessa grande personalidade do teatro

Coluna Por Natália Beukers

Quando entrei para o time de colunistas de Vogue Gente, pensei previamente em algumas ideias para organizar o primeiro mês da coluna. No entanto, acabei deixando de lado uma das pautas que havia inicialmente imaginado – não por desinteresse, muito pelo contrário, mas porque sentia que me faltavam palavras para escrevê-la, aquela inspiração que brota da urgência. Me refiro à pauta que teria como tema central a grande Ruth Escobar (1935-2017), mulher de teatro pela qual venho cultivando incontida admiração.

Acontece que, quando iniciei a coluna, em abril deste ano, ainda estava lendo Maria Ruth, uma autobiografia verdadeiramente emocionante, de 1987. Quem acompanhou meus posts no Infoteatro (@infoteatro_), viu que eu havia começado a ler o livro já em 2020. Demorei para terminar, pois toda vez que me punha em contato com aquele vibrante relato, ficava profundamente tocada com tantas ações revolucionárias por ela protagonizadas ao longo de sua trajetória, levando-me a devaneios que me faziam não seguir com a leitura. Mas, terminei e já sinto muita saudade daquele arrebatador universo. Agora, exatamente um ano depois, decidi que chegou o momento de compartilhar minhas impressões.

Livro Maria Ruth (Foto: Reprodução)

Escrevo este texto ao som de O Bêbado e a Equilibrista – na interpretação memorável, que se tornou um hino, na voz de Elis Regina. Essa música me remete ao universo de Maria Ruth, pois sua vida parece ter sido embalada pela “esperança equilibrista”.

Portuguesa de nascença, filha de pai incógnito, Ruth veio ao Brasil, acompanhada de sua mãe, em 1951. E, por aqui, estabeleceu-se como grande profissional do teatro. Conforme afirmou o escritor e dramaturgo espanhol Fernando Arrabal, “ela foi uma das pessoas mais importantes do teatro do século XX.”

Assim que chegou ao Brasil, com aproximadamente 16 anos de idade, Ruth converteu-se em jornalista, fundando sua própria revista, dedicada à colônia portuguesa, produzida a partir de notícias do além-mar, como ela mesma descreveu. Vocês conseguem imaginar? Ruth Escobar, ainda adolescente, iniciando uma revista e tendo a oportunidade de entrevistar líderes mundiais, como ela mesma conta? Um fenômeno…

Produtora dos lendários espetáculos Cemitério de Automóveis e O Balcão, além do teatro, Ruth lutou intensamente pela causa feminista, pela defesa da democracia em meio à ditadura militar, produziu diversos festivais internacionais de teatro e, nos anos 1980, envolveu-se com a política, eleita deputada estadual por dois mandatos consecutivos.

Cartaz Cemitério de Automóveis (Foto: Divulgação)

Em meio à sua atuação imprescindível para a cena teatral brasileira, inaugurou a sala de espetáculos que leva seu nome, o Teatro Ruth Escobar, que, por sinal, quase teve suas portas fechadas em 2020.

Longe de ter aqui o espaço necessário para uma resenha literária e que permitisse contar mais sobre a trajetória de Ruth Escobar, minha ideia era instigar você, leitor e leitora, a também mergulhar nesse universo, que conta muito sobre o teatro do seu tempo.

Para saber ainda mais, também indico o livro […] metade é verdade – Ruth Escobar, de autoria do pesquisador teatral Alvaro Machado. Nessa nova biografia, lançada este ano, o escritor narra os quarenta anos em que Ruth Escobar esteve no centro da cena teatral brasileira e mundial. Para quem se interessar, no site do Sesc Digital, há um minidocumentário sobre Ruth Escobar, com parte do conteúdo que compôs essa obra. Também é possível assistir, no YouTube, à entrevista de 1995, no programa Roda Viva, da TV Cultura – é espetacular.

O que mais me cativou ao pesquisar sobre a carreira de Ruth Escobar é que, por trás da figura forte da atriz e produtora teatral, havia uma mulher com cicatrizes profundas, de amores vividos intensamente, com mágoas e medos viscerais. Em determinada parte de Maria Ruth, ela confessa: “O que me dá melancolia é perceber que onde cheguei não serve para nada, para ninguém, a não ser para meu próprio conforto. Esse poder pleno em saber-se, só serve para mim mesma”. Ouso dizer que, neste ponto, Ruth Escobar estava enganada. Eu jamais esquecerei tudo que li sobre sua vida… Para mim, sempre ficará o seu exemplo de profissional do teatro e de mulher, como uma marcante inspiração.

Por fim, quero relatar um episódio que aconteceu também em 2020, quando comecei a leitura do livro. Perguntei ao grande Oswaldo Mendes – ator, dramaturgo, jornalista, escritor, cuja amizade me oferece valiosos ensinamentos: “Você conheceu a Ruth Escobar?”, perguntei, ingenuamente. E ele: “Conheci muito.” Oswaldo Mendes não só a conheceu, mas foi seu amigo e, ainda, coautor da peça Revista do Henfil, produzida por Ruth.

Nessa ocasião, Mendes me enviou um texto que escreveu para o programa do 4º Festival Internacional de Teatro, produzido por Ruth Escobar, em 1994. Vale reproduzir um trecho que me parece ser a síntese perfeita de quem foi essa grande mulher: “Tudo na vida de Ruth se reveste de teatralidade. Daí as pessoas se perderem no esforço inútil de entendê-la com a lógica mediana e vulgar, que impõe a tudo uma postura maniqueísta de amor ou ódio. Ruth não tem a linearidade do óbvio. É feita de contradições – como todos, com a diferença que Ruth não as disfarça.”

O que seria do Brasil sem a força das Marias, Clarices e Ruths? Afinal, como afirma a composição magistral de Aldir Blanc – compositor recém-falecido: “Mas sei que uma dor assim pungente, não há de ser inutilmente.”

Toda minha reverência para Ruth Escobar: atriz, produtora teatral, jornalista, política, feminista, mãe, amante e, sempre, revolucionária!

 

Este texto foi, originalmente, publicado no site da revista Vogue Brasil, dentro do segmento ‘Gente’. Para acessar a publicação original, clique aqui.

 

Compartilhar em
Sobre
Natália Beukers

Natália Beukers

Atriz e criadora do Portal Infoteatro, formou-se em Direito pela PUC-SP (2020). Começou a estudar teatro aos 10 anos, formando-se como atriz em 2017. Entre 2017 e 2021, estudou com os atores do Grupo TAPA, participando de três espetáculos: “Anatol”, “O Jardim das Cerejeiras” e “Um Chá das Cinco”, além de ter sido assistente de produção em mais de 10 temporadas da companhia. Professora de teatro desde 2022, atualmente cursa licenciatura no Célia Helena Centro de Artes e Educação. Embaixadora do Teatro B32, também já colaborou com a Folha de S. Paulo e com o segmento 'Vogue Gente', da Vogue Brasil, entre 2021 a 2023, onde publicou mais de 50 textos sobre teatro. Desde a criação do Infoteatro, em abril de 2020, entrevistou mais de 100 profissionais da área teatral.

Siga o colunista

InfTEATRO em números

0 peças no site
0 em cartaz
0 colunas
0 entrevistas

Receba as nossas novidades

Ao se inscrever você concorda com a nossa política de privacidade

Apoios e Parcerias

Inf Busca Peças

Data
Preço

Este website armazena cookies no seu computador. Esses cookies são usados para melhorar sua experiência no site e fornecer serviços personalizados para você, tanto no website, quanto em outras mídias. Para saber mais sobre os cookies que usamos, consulte nossa Política de Privacidade

Não rastrearemos suas informações quando você visitar nosso site, porém, para cumprir suas preferências, precisaremos usar apenas um pequeno cookie, para que você não seja solicitado a tomar essa decisão novamente.