Tudo no teatro é passado. A peça já aconteceu antes de acontecer – foi ensaiada por semanas, meses, antes de fingir que está acontecendo diante da plateia. Os próprios ensaios já eram tempos coagulados – as personagens que os atores tomam contato pela primeira vez já foram escritas muitos anos – séculos – antes, e outros tantos atores já as representaram diante de uma audiência que já esteve ali, um dia, no teatro – quem sabe no mesmo teatro em que agora se vende a ideia de que o que ocorre ao erguer das cortinas é presente em curso. Nunca é. Teatro é passado. Já foi.
Nada mais poderoso em traduzir o que é teatro do que a famosa frase de abertura dos contos de fada: “Era uma vez…” Antes de tudo acontecer tudo já aconteceu. Teatro é território do acontecido. Já foi. A luz já foi marcada, os atores já decoraram o texto, o diretor já fez com que compreendêssemos o que era para ser feito. Nada presente. Tudo para trás. Uma frase péssima que usam recorrentemente é a de que o ator bom é aquele que tem “presença cênica”. Nada mais equivocado. Os atores tem “ausência cênica”, são gente sumida, que já foram, passado, adeus. Gente que lida com fantasmas dum tempo embolorado que fingimos recuperar só para dizer: é atual, é agora, é presente. Só fingimos. Mas falhamos. E é por esta falha que a coisa no palco tem algum sentido de existência. Dá próxima vez que você pisar num teatro, seja no palco ou na plateia, apure seus sentidos: o perfume é embolorado, a imagem já vem com um filtro de sépia, a música que toca ressoa de um gramofone bem antigo. Tudo lá atrás, no passado.
Nota: As informações e opiniões contidas neste artigo são de inteira responsabilidade de seu/sua autor(a), cujo texto não reflete, necessariamente, a opinião do INFOTEATRO.