Na morte, reconta-se a história.
Sempre se falou da influência na vida e no teatro de Zé Celso, e por consequência no Oficina, da sua relação com o Living Theatre. Sempre duvidei disso, mas figurante na história deixei que o próprio Zé desfizesse o equívoco. E ele o fez. Ainda em abril do ano passado no programa Persona da TV Cultura, disponível no YouTube.
Porém, alguns não se deram conta, pois até após a sua morte, ainda se ouve e lê que certamente há uma proximidade da obra de José Celso Martinez Corrêa e do Living, quando não uma influência determinante desse naquele.
Certamente não. Palavra do próprio Zé, que conheceu o grupo no apartamento do ator Pierre Clementi em Paris em 1968 e, “na falta do que dizer, convidei para eles virem”.
E eles vieram, dois anos depois, trazendo até as crianças na aventura tropical.
Além do espaço do Oficina, Zé ofereceu seu apartamento para as visitas e mudou-se para um hotelzinho. “Aí foi foda porque eles eram totalmente messiânicos e imperialistas.”
De fato.
Lembrando. Naquele final dos anos 1960, o Living, saiu do off-Broadway e se deu bem na Europa com o espetáculo “Paradise Now”. Era uma tribo, hoje um “coletivo”, sob comando do casal Judith Malina e Julian Beck. O que teriam a nos ensinar?
No furor dos vinte anos, com alguns colegas da EAD, Escola de Arte Dramática, levados por Dorothy Leirner (atriz e agitadora teatral que mantém o charmoso sotaque romeno no brilho dos 91 anos), fomos trabalhar com o Living Theatre. Até emprestei pra eles um fogão vermelho novinho que voltou em petição de miséria, mas deixa isso pra lá (coisa de ancião ranheta).
Bem, a gente chegava de manhã no Oficina e a tribo já estava numa viagem particular, na qual não se conseguia embarcar. Uns ficaram, eu não. Como Zé Celso, que logo desistiu de trabalhar com eles. Portanto, não dá pra perceber como ele sofreu alguma influência. Nem por osmose.
Não me lembro sequer de vê-lo, depois, na performance do Living num domingo à tarde, na Favela do Buraco Quente, lá pelos lados do Aeroporto de Congonhas. Judith e Julian não queriam estranhos nas apresentações. Imaginem se iríamos perder?! Até porque tudo começava com distribuição de bolo para a plateia. Fomos, de carona com o crítico João Apolinário e sua companheira Maria Luiza Teixeira Vasconcelos, o ator Ivan Lima e o diretor Ademar Guerra, que infernizou Judith Malina (atriz encantadora!) com perguntas impertinentes, indo atrás dela pra baixo e pra cima na favela.
Em seguida, depois de enfrentar em Minas a prisão da ditadura, acusados de “subversivos e narcômanos” e expulsos do Brasil, o Living Theatre voltou aos Estados Unidos. (Continua na minha longa fila de leituras o livro de Carlos Granés, “A invenção do paraíso – O Living Theatre e a arte da ousadia”.)
Julian Beck foi pra Hollywood fazer um papel sinistro em “Poltergeist” e Judith Malina em “A Família Addams”.
E Zé Celso seguiu fazendo sua história no teatro, guiado pela própria cabeça. Sobre a convivência com o Living Theatre “foi um tormento”, ele resume no citado programa da TV Cultura. Confira:
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