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6 marcos do teatro brasileiro que todo mundo deveria conhecer

Coluna Por Natália Beukers

Estava escrevendo a coluna desta semana, que teria como tema o teatro internacional, mas lembrei que estamos no 7 de Setembro e pareceu-me irônico escrever sobre isso bem quando se comemora a independência do Brasil. Por mais que ainda pretenda voltar ao assunto, pois o teatro além das nossas fronteiras sugere inúmeras pautas, decidi seguir em direção oposta.

Sem querer cultivar um espírito excessivamente patriótico – especialmente no lamentável momento em que o Brasil se encontra – no texto de hoje, farei um apanhado de grandes momentos do nosso teatro. Minha ideia não é escrever um texto didático, com referências históricas, mas pincelar algumas passagens que me parecem relevantes e, assim, instigar os leitores.

Já pararam para pensar o que torna o teatro de uma nação forte e influente para a cultura do seu povo? Ter grandes autores e, consequentemente, grandes textos? Atores importantes e reconhecidos internacionalmente? Grupos ou companhias teatrais consolidadas? Intuo que as três alternativas estejam corretas e o Brasil se encaixa em todas elas, sabia?

Em tempos em que mega musicais parecem concentrar a preferência do grande público, é de extrema relevância sabermos que o teatro brasileiro tem enorme tradição. Como explicou certa vez a saudosa crítica de teatro Barbara Heliodora, no livro ‘O Teatro explicado aos meus filhos’: “O Brasil tem sua cultura marcada pela colonização (…) foi obrigado a assimilar o que lhe foi imposto para, só aos poucos, transformar o herdado em algo seu.” – seja a colonização lusitana, francesa ou norte-americana. Portanto, vamos ao que o teatro brasileiro nos oferece:

Martins Pena e João Caetano

Quem inicia seus estudos sobre teatro, com certeza se depara com a obra de Martins Pena. Autor de textos como ‘O Judas em Sábado de Aleluia’, ‘Quem Casa quer Casa’, ‘O Noviço’ e ‘O Juiz de Paz na Roça’, foi o criador da comédia de costumes brasileira. Importante por retratar a vida do Rio de Janeiro dez anos depois da Independência, teve a capacidade de observar criticamente o comportamento de seus contemporâneos. Pena foi contemporâneo de João Caetano, o nosso primeiro grande ator – em São Paulo, um conhecido teatro da prefeitura leva o seu nome.

França Junior e Artur Azevedo

Posteriormente, França Junior iniciou-se no teatro por volta de 1890. Escreveu peças divertidíssimas: ‘Como se Faz um Deputado’ e ‘Caiu o Ministério’, ambas condenando o ridículo da vida política. Anos depois, após a Proclamação da República, entra em cena o autor Artur Azevedo, tendo escrito uma centena de obras. Suas peças mais conhecidas são: ‘A Capital Federal’ e ‘O Mambembe’ (esta também de autoria de José Piza). Sobre ‘O Mambembe’, Fernanda Montenegro afirmou: “Expressava com adorável humor e amor essa herança de sobrevivência do teatro brasileiro”. A atriz participou de uma das principais montagens da peça, em 1959, com o grupo que fez história, Teatro dos Sete.

Nelson Rodrigues e sua obra Vestido de Noiva

Com a Segunda Guerra Mundial, chegam ao Brasil o ator polonês Ziembinski e a atriz francesa Henriette Morineau, o que representou enorme acréscimo para o teatro brasileiro. À época, enquanto os brasileiros tinham preferência pela montagem de textos estrangeiros, Ziembinski estimulou a montagem de textos nacionais. Nesse clima surge a famosa montagem de Vestido de Noiva – texto do grande Nelson Rodrigues –, em 1943, marcando o início do moderno teatro brasileiro. Depois surgem autores como Millôr Fernandes, Jorge Andrade, João Cabral de Melo Neto e Ariano Suassuna. Vocês devem estar se perguntando onde estão as autoras brasileiras… Infelizmente, elas não tiveram tamanho protagonismo, certamente por contingências sociais, mas muitas delas escreveram textos importantíssimos para a dramaturgia brasileira – abordarei o tema na próxima coluna.

TBC e EAD

Em 1948 é fundando, em São Paulo, o memorável Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), por Franco Zampari. Entre os artistas que passaram por lá estão nomes consagrados como Cacilda Becker, Paulo Autran, Cleyde Yáconis, Fernanda Montenegro, entre outros craques. Paralelamente a isso, também em 1948, é inaugurada a Escola de Artes Dramáticas (EAD) em São Paulo, sob coordenação de Alfredo Mesquita. A EAD é uma unidade complementar da Universidade de São Paulo (USP) e está em funcionamento até os dias de hoje.

Teatro de Arena e Teatro Oficina

Indo na contramão do que pregava o TBC – preocupado com a estética e montagem de grandes clássicos estrangeiros – surge o Teatro de Arena, iniciado por José Renato. Responsável pela montagem exclusiva de textos nacionais, com foco no teatro político e social, o Arena envolveu grandes nomes do nosso teatro como Gianfrancesco Guarnieri (autor do clássico ‘Eles Não Usam Black-Tie’), Oduvaldo Vianna Filho (o Vianinha), Chico de Assis e Augusto Boal. Em circunstância similar, surge o reconhecido Teatro Oficina, dirigido por José Celso Martinez Corrêa (o Zé Celso). O Oficina foi responsável pelas lendárias montagens de ‘Os Pequenos Burgueses’, de Gorki, e ‘O Rei da Vela’, de Oswald de Andrade. Depois surgem diretores como Antunes Filho (diretor falecido do Centro de Pesquisa Teatral (CPT), responsável pela famosa montagem de ‘Macunaíma’), o diretor Ademar Guerra, e por aí vai.

A Censura na Ditadura Militar

A censura decorrente da ditadura militar praticamente dizimou o teatro brasileiro. O público que parou de frequentar as salas de espetáculo em virtude da repressão na época, nunca mais foi o mesmo. Nesse período, era uma batalha montar peças no Brasil, como foi o caso de ‘Navalha na Carne’, de Plínio Marcos, ou Calabar, de Chico Buarque e Ruy Guerra. Em entrevista com a grande atriz Walderez de Barros, ela me disse que, antes da ditadura militar, havia sido conquistado um público para o teatro, tradicional e consistente. Mas, após a ditadura, parece que regredimos à estaca zero. A atriz ainda comentou que o mesmo triste fenômeno poderá ter acontecido com a crise sanitária da covid-19. Para aqueles que tem interesse pelo tema, indico os livros ‘O Panorama do Teatro Brasileiro’, de Sábato Magaldi, e Apresentação do Teatro Brasileiro Moderno, de Décio de Almeida Prado.

Às vezes tenho a impressão de que apenas os que trabalham com teatro se interessam pelo tema. No entanto, o teatro é um instrumento social poderosíssimo, meio pelo qual podemos, por exemplo, questionar os poderosos de plantão, discutir nossos problemas e, mais do que tudo, conhecermos melhor a nós mesmos.

Nota: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Vogue Brasil.

 

Este texto foi, originalmente, publicado no site da revista Vogue Brasil, dentro do segmento ‘Gente’. Para acessar a publicação original, clique aqui.

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Sobre
Natália Beukers

Natália Beukers

Atriz, criadora do Infoteatro e colaboradora de Cultura da Vogue Brasil, tendo escrito mais de 50 textos até então. Formada em Direito pela PUC-SP (2020), começou a estudar teatro aos 10 anos de idade, formando-se como atriz em 2017. Estudou, de 2017 a 2021, com os atores do Grupo TAPA, participando de três espetáculos do grupo: “Anatol”, “O Jardim das Cerejeiras” e “Um Chá das Cinco”. Foi assistente de produção em mais de 10 temporadas da companhia. A partir da criação do Infoteatro, em abril de 2020, entrevistou mais de 100 profissionais da área teatral.

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