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Danilo Santos de Miranda, A Coragem Humanista

Coluna Por Oswaldo Mendes

Quase inevitável, ao falar de um amigo que partiu, que se fale de si mesmo. A notícia da morte nos faz repassar, em flashes, momentos e conversas. Uma que me veio, ao saber de Danilo Santos de Miranda, foi quando o convidei, e ele aceitou participar da leitura de “Trotsky no exílio”, na Casa do Saber, em um sábado de novembro de 2015. Adaptei o texto original de Peter Weiss, adicionando episódios, depoimentos e informações revelados após a morte do autor. E diante da quantidade de personagens, convidei 49 atores e não atores para a leitura. Danilo entre eles. Era uma cena curta, no papel de Martov, líder menchevique, que enfrentou os bolcheviques no 2º Congresso do Partido Social Democrata Russo em 1903 e depois, em outubro de 1917, rompeu com Lenin e Trotsky, interpretado por Antonio Fagundes. Sociólogo e pensador, Danilo sabia bem os caminhos e descaminhos da Revolução Russa.

No ensaio, sábado anterior à leitura pública, Lígia Cortez e Ivo Muller me informaram que não participariam. Por que? Simples, Bob Wilson, com quem eles ensaiavam Garrincha no Sesc, não os liberou para o Trotsky. Sem problema. Lígia Cortez, que faria Natasha, companheira de Trotsky, foi substituída por Selma Luchesi. E André Falcão substituiu Ivo Muller, no papel do assassino Frank Jacson.

Onde entra Danilo nessa história?

Danilo Santos de Miranda, Oswaldo Mendes e Tuna Dwek – Foto: Acervo Pessoal

Entre sério e zombeteiro comentei com ele, diante do elenco, que mais uma vez nós os nativos nos curvaremos aos espelhinhos e bugigangas do colonizador, que o Sesc gentilmente patrocinava. Danilo concordou, entre sério e zombeteiro. Você tem toda razão, disse. Rimos e o ensaio seguiu.

Tudo isso pra dizer que a amizade pessoal e a admiração intelectual não me impediram de expor dúvidas sobre a política cultural do Sesc, especialmente em relação ao teatro. Ouvir e divergir sem perder a ternura, eis uma virtude notável de Danilo. Mais que diretor regional do Sesc, _que outro haverá como ele?_, era um humanista a serviço da esperança em uma sociedade melhor. Que enfrentava riscos.

Danilo (ao fundo com Graça Berman) e elenco se “Trotsky no exílio”, 2015 – Foto: Acervo Pessoal

Quando nos primeiros meses da pandemia, Florestan Júnior solicitou a cessão do palco do Sesc Anchieta para gravar a leitura encenada de “Vicente e Antonio”, Danilo concordou apesar das resistências internas, compreensíveis por conta do Coronavírus. A gravação foi feita em segurança. Escrevi a peça sobre a amizade de Florestan Fernandes e Antonio Candido para celebrar o centenário do sociólogo. Com Walter Breda, Augusto Zacchi e Caetano O’Maihlan dirigidos por Eduardo Tolentino, o vídeo seria, como foi, exibido no YouTube pelo UOL em parceria com Sesc e Casa do Saber em 22 de julho de 2020. Graças a Danilo Miranda, que (suspeito) sugeriu depois às edições do Sesc publicar a peça, sem que eu pedisse. Aliás, não nos pedimos favores nessa longa amizade. Ainda assim eu me sinto, para sempre, seu devedor. Obrigado, Danilo.

Nota: As informações e opiniões contidas neste artigo são de inteira responsabilidade de seu/sua autor(a), cujo texto não reflete, necessariamente, a opinião do INFOTEATRO.

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Sobre
Oswaldo Mendes

Oswaldo Mendes

Oswaldo Mendes, ator e autor de teatro, formado pela EAD, Escola de Arte Dramática de São Paulo em 1971. Jornalista até 1992, cofundador da Associação Paulista de Críticos de Arte, APCA, trabalhou nos jornais Última Hora e Folha de São Paulo. Prêmio Jabuti por "Bendito Maldito - Uma biografia de Plínio Marcos" (Editora Leya). Como autor, escreveu diversas peças como, "Brecht segundo Brecht", "Revista do Henfil", "A dança do universo" entre outras.

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