Você está na cidade de:

O que penso sobre as grandes damas do teatro

Coluna Por Natália Beukers

Quando penso nas grandes damas do teatro, minha imaginação vai longe! Percorro cenários e tempos que não vivi. Vem à mente Ruth de Souza, Tônia Carrero, Nathalia Timberg, Marília Pêra, Walderez de Barros, Cacilda Becker, Beatriz Segall, Eva Wilma, Bibi Ferreira, Fernanda Montenegro e tantas outras.

A começar por seus nomes que, para mim, são um luxo sem igual! A sonoridade de cada um deles me deixa sempre perplexa. Ruth de Souza… já experimentou dizer em voz alta? Maravilhoso!

Em um segundo momento, penso sempre nas figuras. Cada uma a seu modo; elegância inata. Grandes damas… mais do que isso, Damas do teatro. Sobrancelhas finas e arqueadas, dedos longos, cabelos repletos de laquê – sem um fio para fora aparente. Penso em sapatos de salto alto grossos… talvez brancos.

E o perfume de cada uma delas… Consigo sentir rosas para Tônia, lavanda para Nathália e – sem querer pecar pelo trocadilho – alguma fragrância frutada para Marília. Mais adiante, elaboro a imagem de seus parceiros. Imagino Walderez discutindo a fala de um texto com Plínio Marcos; Cacilda chamando Walmor Chagas para ensaiar; “meu bem, já estamos atrasados!” – ouço, em meus pensamentos, Maurício Segall clamando por Beatriz.

E o entorno? Começo a imaginar as décadas de 1950, 1960, 1970, o teatro nacional fervilhando a partir de suas divas… Os restaurantes cheirando a charuto, o tilintar das taças, o som chiado das vitrolas, foxtrot, o início da bossa nova, o tropicalismo. Que lugares fantásticos… Mas, à medida que vou viajando por meus pensamentos, me deparo sempre com o mesmo lugar: tacos de madeira, as cortinas empoeiradas, coxias à meia-luz, o ranger das poltronas, figurinos sobrepostos em araras pelo caminho… Sou transportada para o teatro.

E, ao me aproximar do palco, Eva já se transformou em Jane (em O que Terá Acontecido a Baby Jane?) … Bibi em Joana – inclusive já conversa com Creonte (em Gota d’Água). Quando chego mais perto, a beleza de cada uma dessas damas se desdobra na inteireza que elas são capazes de imprimir a cada personagem, em cada cena, desde o mais simples gesto ou sussurro.

Percebo que as damas do teatro são, na verdade, artesãs da arte. Essas mulheres são artistas trabalhando arduamente em busca do aperfeiçoamento de seu ofício. Quando me vejo imersa nesses devaneios e me sinto neste espaço sagrado, fico comovida. Percebo que a beleza, em benefício da arte de representar, cede lugar; os saltos altos podem se tornar pés descalços; vejo que o romantismo ou idealização do que é ser atriz vai à crueza do trabalho exaustivo, da inspiração para a transpiração. Disso retiro que o ofício do ator é o trabalho cotidiano, a labuta da repetição em cima das tábuas dos palcos.

Na minha cabeça, essas damas vão ganhando novas formas, mais firmeza, concretude. Elas vão se tornando, momento a momento, Atrizes. Sim, Atrizes com “A” maiúsculo! É isso o que elas são. Como disse Fernanda Montenegro: “Todo mundo pode ser artista. Agora, ator (neste caso, Atriz), não é todo mundo que pode ser.”

São Atrizes reconhecidas pois, antes de mais nada, tornaram o teatro o propósito de suas vidas. Acima de tudo, sem exceção de nenhuma, foram e são grandes profissionais. Conquistaram glória, sucesso, salas de espetáculo lotadas, aplausos à custa de muito trabalho.

Na semana passada, uma das grandes atrizes partiu. Eva Wilma. Sua carreira se entrelaçou com momentos vibrantes das artes dramáticas no teatro, no cinema e na televisão, onde alcançou o reconhecimento do grande público. Foram mais de 60 trabalhos na TV, 30 filmes, 60 peças, 90 premiações. Eva parte e o país a aplaude de pé. Uma vida dedicada à sua vocação. Ela será sempre uma inspiração para uma atriz iniciante. Por isso fiquei pensando em todas elas… as damas do teatro são grandes inspirações. Com elas eu imagino, eu sonho, e depois volto à realidade, de um longo caminho a percorrer.

 

Este texto foi, originalmente, publicado no site da revista Vogue Brasil, dentro do segmento ‘Gente’. Para acessar a publicação original, clique aqui.

Compartilhar em
Sobre
Natália Beukers

Natália Beukers

Atriz, criadora do Infoteatro e colaboradora de Cultura da Vogue Brasil, tendo escrito mais de 50 textos até então. Formada em Direito pela PUC-SP (2020), começou a estudar teatro aos 10 anos de idade, formando-se como atriz em 2017. Estudou, de 2017 a 2021, com os atores do Grupo TAPA, participando de três espetáculos do grupo: “Anatol”, “O Jardim das Cerejeiras” e “Um Chá das Cinco”. Foi assistente de produção em mais de 10 temporadas da companhia. A partir da criação do Infoteatro, em abril de 2020, entrevistou mais de 100 profissionais da área teatral.

Siga o colunista

InfTEATRO em números

0 peças no site
0 em cartaz
0 colunas
0 entrevistas

Receba as nossas novidades

Ao se inscrever você concorda com a nossa política de privacidade

Apoios e Parcerias

Inf Busca Peças

Data
Preço

Este website armazena cookies no seu computador. Esses cookies são usados para melhorar sua experiência no site e fornecer serviços personalizados para você, tanto no website, quanto em outras mídias. Para saber mais sobre os cookies que usamos, consulte nossa Política de Privacidade

Não rastrearemos suas informações quando você visitar nosso site, porém, para cumprir suas preferências, precisaremos usar apenas um pequeno cookie, para que você não seja solicitado a tomar essa decisão novamente.